Marx nas margens: Nacionalismo, etnia e sociedades não ocidentais

Lucas Parreira Álvares

Review of the Portuguese translation of Kevin B. Anderson’s “Marx at the Margins.”

Kevin B. Anderson, Boitempo

Le Monde Diplomatique Brazil May 2020

 

O livro oferece ao público uma investigação cuidadosa, rigorosa e de fôlego. A obra concretiza longos anos de trabalho de Kevin B. Anderson, professor da University of California, acerca da posição de Karl Marx em relação a experiências distantes do mainstream do marxismo tradicional: foge dos contextos europeus da “grande indústria” e refugia-se nas passagens sobre as formas sociais não ocidentais e/ou que precederam o modo de produção capitalista.

A causa é justificável: extinguir de vez a noção de que Marx seria um autor “eurocêntrico” ou “evolucionista”. Para tanto, Marx nas margens não se opõe meramente às críticas conservadoras a Marx, polarizando também com autores como Edward Said e Michel Foucault, caros às tradições contemporâneas de pensamento crítico. A esse propósito, Anderson convence.

Centra-se nas “margens”, mas não sem perder de vista o “centro”. Alguns leitores poderiam argumentar que Marx nas margens é um livro que apresenta um Marx deslocado de sua crítica máxima. Todavia, Anderson demonstra que Marx não relega as sociedades não ocidentais apenas a seus textos políticos e jornalísticos. Ao contrário, a importância da ênfase dada por Marx a essas questões fundamenta seus textos críticos à economia política, como O Capital e os Grundrisse.

Anderson também oferece argumentos para uma importante discussão da tradição marxista. Se por um lado alguns intérpretes acreditam que o pensamento de Marx reduz o operariado inglês da grande indústria ao protótipo de “missionário da revolução”, Anderson abre aspas para um Marx que falou em “classes trabalhadoras” em seus escritos sobre a França, que sugeriu uma “revolução escrava” em seus artigos jornalísticos sobre a Guerra Civil Americana e que vislumbrou nas comunas rurais russas a capacidade de contribuir não só para uma revolução naquele país como também ser o “ponto de partida” para o movimento revolucionário em toda a Europa. Posição condizente com o século XX, que presenciou diversas revoluções em países da periferia do sistema capitalista, como Vietnã, Cuba, Rússia, China e Moçambique.

A exposição de Marx nas margens é um convite a uma leitura agradável. A todo momento o leitor é bem situado ao texto, localiza-se pelas temáticas cuidadosamente organizadas, aprofunda-se em temas de seu interesse pelas notas de rodapé e, o principal, acompanha o aperfeiçoamento teórico e crítico do pensamento de Marx durante o desenvolvimento de sua obra. Anderson nos convida a um retorno a Marx, em um momento tão propício e urgente, que é bom não recusarmos.

 

LEAVE A REPLY

Your email address will not be published. Required fields are marked *

0 Comments

FROM THE SAME AUTHOR

No items found

IMHO Journal
Privacy Overview

This website uses cookies so that we can provide you with the best user experience possible. Cookie information is stored in your browser and performs functions such as recognising you when you return to our website and helping our team to understand which sections of the website you find most interesting and useful.