Rio de Janeiro entre o caos e a soberania – laboratório de reorganização da extrema direita brasileira

Joeline Rodrigues

Summary: Portuguese version of article published in English here

Nesta terça-feira, 28 de outubro, o Rio de Janeiro acordou com o assombro de uma megaoperação policial contra o Comando Vermelho. Uma ação violenta coordenada pelo governador Cláudio Castro (PL – partido de Bolsonaro) no Complexo do Alemão e da Penha, maiores comunidades do Rio de Janeiro, onde residem 200 mil pessoas. A operação foi considerada a mais letal da história do Rio de Janeiro, superando o Carandiru em 1992 em São Paulo.

A tática de guerra aberta contra o narcotráfico adotada por Cláudio Castro visa atingir dois objetivos e nenhum é a melhoria da vida da população das favelas ou ainda a segurança pública do Rio de Janeiro. Diante da perda de força do bolsonarismo nos últimos tempos, após a tentativa fracassada de Eduardo Bolsonaro de pedir a intervenção de Trump no Brasil com os tarifaços, que resultou na melhoria da imagem interna de Lula e sua aprovação ao defender a soberania nacional, e com o encontro amistoso de Lula com Trump na Malásia que acabou de enterrar a tentativa histérica de Eduardo de salvar o pai – ex presidente Bolsonaro – da cadeia, a extrema direita brasileira parte para uma nova ofensiva, dessa vez, violenta e armada.

Tendo em vista que os EUA com Trump tem adotado uma política ofensiva de “guerra às drogas” na América Latina que visa intervenção armada na Venezuela e Colômbia com a justificativa de combate ao narcotráfico. A necropolítica genocida racista da extrema direta entra em ação para buscar forjar o caos e uma situação de instabilidade para burlar a soberania nacional sustentada por Lula e buscar, nessa suposta luta contra o narcotráfico, obter o apoio de Trump para intervenção armada também em território brasileiro, já que o “nacionalismo” fascista significa de fato a submissão aos interesses imperialistas e colonialistas.

Castro levou adiante seu plano violento e culpou o governo Lula por não enviar reforços, pois o governo Lula se recusa a aplicar a GLO (Garantia da Lei e Ordem prevista na Constituição no artigo 142) porque entende que as favelas não devem ser ocupadas pelas Forças Armadas e, para tanto, o governo deve reconhecer a falência do órgãos de segurança nacional e transfira as operações de segurança para o governo federal, para as Forças Armadas.

Lula já tem experiência neste tipo de cenário e sabe a complexidade que o conforma, pois no caso do caos da invasão dos golpistas do 8 de janeiro, Lula não assinou a GLO – aconselhado por Janja, sua esposa – e evitou que o golpe planejado pela extrema direita bolsonarista, que pretendia inclusive seu assassinato, fosse consolidado.

Há denúncias de que Claudio Castro tenha enviado relatórios para o governo Trump demandando “apoio” contra o “narcoterrorismo” – termo que não existe no vocabulário jurídico brasileiro para denominar as facções criminosas, mas que serve como mote necessário para subsidiar uma narrativa interna e internacional que legitime a intervenção da Casa Branca com Trump que tem violado diversas leis internacionais em sua ofensiva contra a Venezuela e Colômbia.

O que explicita os objetivos de fundo desta operação, pois a favela é somente a ponta do iceberg do crime organizado como ficou demonstrado com a operação Carbono Oculto, conhecida publicamente em agosto, realizada pela Polícia Federal, com inteligência e planejamento, e sem disparar nenhum tiro e sem nenhuma morte, conseguiu desmontar a organização criminosa, e demonstrar que o núcleo do crime organizado não está na favela, mas na Faria Lima – centro financeiro e corporativo brasileiro, e sobre a qual a extrema direita brasileira não se manifestou.

Não é de hoje que se sabe que as favelas e periferias do Rio de Janeiro se constituem como um laboratório das tecnologias de morte com a obtenção de equipamentos militares de origem israelense, inclusive, como a Global Shield. Não à toa, há na cidade uma região no Complexo da Maré chamado Faixa de Gaza. E isso pode ser verificado com o número de mortos nesta chacina – 132 até agora – que superou o registrado no mesmo dia na Faixa de Gaza, que registrou 104 mortes. Infelizmente, isso não nos causa espanto pois estamos lidando com a mesma política de morte em nome do poder e do lucro da lógica do capital em crise que busca se reorganizar e utiliza da indústria bélica para expandir-se, o que converge com os objetivos da extrema direita de fomentar o medo e o caos, os principais ingredientes que utilizam para rearticular-se.

Para Claudio Castro (PL)  que foi contra a PEC da Segurança Pública enviada pelo governo federal ao Congresso, através da Carta de Florianópolis assinada por governadores do Sul e Sudeste, houve apenas 4 vítimas – os policiais mortos envolvidos na operação. O que expressa como a extrema direita, que se pauta no cristianismo sionista – Claudio é católico e aliado de evangélicos de extrema direita -, considera a vida do pobre e preto da favela descartável, reproduzindo com naturalidade e sem constrangimento a herança escravocrata racista estrutural, em detrimento dos próprios interesses, que estão acima de tudo, recorrendo inclusive a termos da época da didatura para legitimar sua ação: “Ou soma no combate à criminalidade ou suma”, parafraseando o lema da ditadura (1964-1985) – “Brasil, ame-o ou deixe-o”.

Mesmo acusando o presidente Lula de negar apoio e embora admita não ter pedido apoio ao governo para executar a operação, como confirma Ricardo Lewandowski – Ministro da justiça, segundo Claudio Castro (PL), a operação foi um sucesso e marca o “início de um grande processo no Brasil”, em véspera de ano eleitoral do Brasil e que Lula já afirmou que será candidato enquanto Bolsonaro irá para a cadeia.

Com todo esse cenário armado, a questão que se impõe é se Trump seguirá a trilha aberta pela extrema direita brasileira, submissa e colonizada, escancarada com a operação de Claudio Castro e colocará o Brasil sob suspeita, sujeito à investigação e possível intervenção, como já vem buscando levar a cabo para ampliar o raio de alcance de poder na América Latina. E, diante dessa possibilidade, será que a esquerda brasileira terá força e organização para reagir além do espectro eleitoral, que espera lograr com Lula, e posicionar-se de forma práxica no terreno mais profundo da política e da história?

LEAVE A REPLY

Your email address will not be published. Required fields are marked *

0 Comments

FROM THE SAME AUTHOR

IMHO Journal
Privacy Overview

This website uses cookies so that we can provide you with the best user experience possible. Cookie information is stored in your browser and performs functions such as recognising you when you return to our website and helping our team to understand which sections of the website you find most interesting and useful.